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domingo, 15 de março de 2015

Especial de Domingo

Há menos de uma semana do início do 2º Raid Aéreo Sudeste-Nordeste Costa Esmeralda, que tem o apoio do Núcleo Infantojuvenil de Aviação - NINJA, reproduzimos conteúdo sobre os primeiros raids da aviação naval brasileira.
Boa leitura.
Bom domingo!

Os primeiros "raids" da Aviação Naval
Viagens de aviões são realizadas nos dias de hoje praticamente para qualquer lugar do planeta. Voos de longa distância tornaram-se tão frequentes quanto viagens locais. Mas essa realidade atual difere muito da aviação nas duas primeiras décadas do século XX. Era uma época de pioneirismo. As aeronaves existentes eram precárias e pouco potentes. Os aviadores com mais experiência mal chegavam a ter dez anos de pilotagem e os recursos em solo e auxílio à navegação aérea praticamente não existiam. Todos esses fatores faziam dos voos não locais verdadeiras epopeias aéreas. Por essa razão qualquer voo que ultrapassasse as cercanias dos centros de aviação eram considerados "raids" aéreos. O primeiro "raid" aéreo da Aviação Naval Brasileira ocorreu pouco depois da chegada e montagem das aeronaves Curtiss modelo F 1914 da Escola de Aviação.

Foto de um dos Curtiss Modelo F 1914 tirada em 1918, em frente a Praça Mauá, Baía de Guanabara. Raramente eram vistos fora da Baía devido principalmente a inexperiência dos pilotos e às limitações das aeronaves. Foto: SDM

A Marinha possuía aviadores com pouca experiência e os aviões recém adquiridos ainda eram novidades para os oficiais brasileiros. Portanto, coube ao instrutor de voo, mecânico e também consultor da empresa Curtiss, Sr. Orthon W. Hoover, a pilotagem da aeronave. Ao seu lado, estava o Comandante da Escola de Aviação Naval Capitão-de-Corveta Protógenes Guimarães.

Os dois integrantes do voo antes da partida do primeiro "raid"

Na manhã do dia 12 de outubro de 1916, a aeronave Curtiss F "C1" decolou das proximidades da Ilha das Enxadas (atual CIAW) rumo a Enseada Baptista das Neves, em Angra dos Reis, onde funcionava o Colégio Naval.

Colégio Naval em Angra dos Reis

O voo de regresso foi adiado para 14 de outubro em função das condições climáticas desfavoráveis. No dia 14, logo após a decolagem, um vento forte fez com que o os tripulantes optassem por um pouso na Baía de Sepetiba, em busca de proteção. A demora do retorno da aeronave ao Rio de Janeiro fez com que fosse acionada uma operação de busca e salvamento. Posteriormente, os tripulantes conseguiram enviar um telegrama, a partir de Itacuruçá, informando sobre o pouso. A aeronave ali permaneceu até que uma embarcação da Marinha providenciasse o reabastecimento. Na manhã do dia 15, a aeronave decolou e executou o seu translado final até a Ilha das Enxadas (1). Às 11:30h, o primeiro "raid" era concluído com sucesso e muita aventura.
Dispondo de poucas aeronaves, infra-estrutura precária e tendo como prioridade a instrução básica de aviadores navais brasileiros, os anos de 1917 e 1918 não tiveram voos de longa duração. Somente em 1919 os "raids" seriam retomados. Agora comandados por pilotos brasileiros. Em 15 de agosto, amerrissava em Ilha Grande o aerobote biplano Curtiss HS-2L nº 11.
Um voo mais longo seria executado em 17 de outubro do mesmo ano. Sob o comando do então Tenente Delamare, o HS-2L nº 15 amerrissou nas águas do estuário do porto de Santos/SP (2). A barreira interestadual havia sido quebrada. O próximo passo era alcançar os países vizinhos. Um dos desafios aéreos no ano de 1920 foi a realização de um "raid" entre as capitais do Brasil (Rio de Janeiro) e da Argentina (Buenos Aires). As primeiras duas tentativas, realizadas por pilotos estrangeiros (o primeiro um inglês e o outro um argentino), não tiveram sucesso. No dia 6 de outubro de 1920, o então Tenente Delamare, em companhia de um sub-oficial, decolou com um Macchi M9 para tentar realizar a façanha aérea.

Modelo Macchi M.9

No mesmo dia atingiu a cidade de Santos e decidiu prosseguir viagem. Passando próximo de Camburiú/SC, a aeronave teve uma avaria no comando dos ailerons. Esse problema fez com que eles descessem para reparos. Após os reparos, a aeronave iniciou a sua decolagem quando então o casco atingiu uma rocha submersa. Mesmo após o impacto, o avião conseguiu decolar e prosseguiu viagem. Próximo ao entardecer, decidiram pousar perto de Anhatomirim/SC para o pernoite. As avarias no casco fizeram com que a aeronave naufragasse próximo à praia. O avião foi então desmontado e rebocado para Florianópolis/SC, onde reparos de emergência foram feitos (2). A viagem só pode prosseguir no dia 16 de outubro, quando o Macchi 9 decolou de Florianópolis. Ao passarem por Laguna, os suportes do aileron se desprenderam, forçando um novo pouso para reparos. Durante a amerrissagem na Lagoa Imaruí, a asa direita entrou na água. A aeronave foi então submetida a novos reparos em Laguna, onde permaneceu até o dia 26 do mesmo mês. O trecho Laguna - Porto Alegre também teve seus problemas. Durante o voo, o revestimento de lona da hélice desprendeu-se, forçando uma amerrissagem em Cideira, na Lagoa dos Patos. A aeronave atingiu Porto Alegre no mesmo dia (26 de outubro) e pousou no Rio Guaíba. A decolagem de Porto Alegre ocorreu no dia 30 e, depois de um pouso em Pelotas, chegaram a cidade de Rio Grande. Nessa altura da viagem, a aeronave precisava de uma revisão geral. Decidiu-se então retirá-la da água e executar os reparos no seco. Durante o içamento, o Macchi caiu do guindaste encerrando de vez a viagem. Mesmo assim, aquele voo ficaria para a história como o mais longo da Aviação Naval até então.
O ano de 1922 assistiu a um feito inédito na aviação mundial. Dois pilotos portugueses, Gago Coutinho e Sacadura Cabral, pilotando hidroaviões Fairey F-3, realizaram o trecho Lisboa - Rio de Janeiro.
No segundo semestre de 1922, duas aeronaves De Havilland 9 do exército do Chile, tentaram realizar o voo Santiago - Rio de Janeiro. Um dos aviões foi perdido em Castellanos (Argentina) e a outra aeronave decidiu prosseguir viagem sozinha. Chegando nas proximidades de Ubatuba/SP, as condições meteorológicas não permitiram o prosseguimento da viagem e o piloto decidiu pousar. Na manobra, a aeronave capotou e ficou completamente inutilizada. Num gesto de boa vontade do Governo Brasileiro, a Aviação Naval cedeu a aeronave Curtiss HS-2 nº 11 para que o piloto chileno completasse a viagem. A Aviação Naval Brasileira deu a sua contribuição nesse voo de 3.390 km. 
Sem dúvida, o mais notável voo de longo curso da Aviação Naval naquela época foi a realização do "raid" Rio de Janeiro - Aracaju. Foram selecionados quatro Curtiss F5L (nº 1, 2, 3, 4) para a empreitada. As aeronaves decolaram do Rio de Janeiro em 1º de julho de 1923 e após 3:40h, amerrissaram em Vitória/ES. No dia seguinte as aeronaves seguiram em direção a cidade de Salvador/BA. Três aeronaves chegaram na capital baiana por volta das 15:30h do dia 2 de julho. Nessa data foi comemorado o Centenário da Independência da Bahia. O quarto avião (nº 4) desceu em Itaparica por causa do mal tempo. Atingiu Salvador somente no dia 5. Após alguns dias, o comandante da esquadrilha determinou Recife como a próxima etapa da viagem. Os aviões decolaram de Salvador no dia 15 de julho e chegaram em Aracaju/SE no mesmo dia. Uma avaliação dos cascos dos aerobotes e a necessidade de uma revisão adequada dos motores fez com que o comandante resolvesse iniciar a viagem de volta ao Rio de Janeiro. Iniciando no dia 29 de julho, a viagem de volta terminou na capital federal em 8 de agosto. Foi o primeiro voo de um grupo de aeronaves da Aviação Naval a atingir mais de 3.000 quilômetros (2). A Tabela abaixo resume os "raids" realizados pela Aviação Naval até o ano de 1923.


Na década de trinta regularizaram-se os voos de longo curso através das linhas do Correio Aéreo Naval. Mesmo sendo parte de uma rotina diária, cada voo ainda representava uma aventura própria.

Bibliografia:

(1) COMFORAERNAV. Histórico.
Disponível em: www.foraer.mar.mil.br

(2) LAVENERIE-WANDERLEY, N. F. História da Força Aérea Brasileira. 2. ed. Ed. Gráfica Brasileira: Rio de Janeiro, 1975. p. 60-63.

(3) SRPM. 84º Aniversário da Aviação Naval. In: No Mar nº 701. Serviço de Relações Públicas da Marinha, Brasília/DF. p.5

(4) ANDRADE, R. P. História da Construção Aeronáutica no Brasil. Artgraph Ed., São Paulo, 1991. 327 p.