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domingo, 17 de abril de 2011

Especial de Domingo

Aeronáutica: 70 Anos de História (Década de 80–Parte 2)

Alcântara é escolhida para ser o “trampolim” para o espaçoA conquista do espaço requer investimento, tecnologia, projetos financeiramente viáveis e, se possível, uma localização geográfica privilegiada. E o Brasil possui este lugar. Situado no pequeno município de Alcântara (MA), separado por 10 km de faixa de mar da ilha de São Luís, o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) foi criado pelo Ministério da Aeronáutica nos anos 80 para assumir a responsabilidade de ser a principal base da então Missão Espacial Completa Brasileira (MECB). Localizado a pouco mais de dois graus da linha do Equador, o CLA se destaca por possibilitar lançamentos de foguetes com menor consumo de combustível, ou com maior capacidade de carga. Isto é, se um foguete for lançado no CLA, o artefato poderá levar satélites até 31% mais pesados que outro semelhante que saiu de bases de outros países. Foi por este motivo, e ainda pelo clima favorável, facilidade logística e estabilidade geológica, que em 1982 foi criado o Grupo para Implantação do Centro de Lançamento de Alcântara (GICLA). Transformar o litoral maranhense em uma moderna base do programa espacial significou investimentos em equipamentos como plataformas de lançamento, radares de acompanhamento, sistemas de telemetria, centrais de meteorologia, edifícios para preparo de satélites e propulsores, depósitos de combustíveis, pista de pouso e toda a infraestrutura necessária para apoiar os militares e civis que trabalhariam ali. Para tornar o projeto real, foi ativado em 1° de março de 1983 o Núcleo do CLA. Outra preocupação foi o cuidado com as famílias que moravam na área, pois, entre instalações e áreas de segurança, a nova base ocuparia 620 km quadrados de área. Finalmente, em dezembro de 1989, a Operação Pioneira efetivamente inaugurou o CLA. Quinze foguetes SBAT-70 e dois SBAT-152 foram lançados para os primeiros testes. Dois meses depois, seria a vez de um foguete Sonda-2, em uma sequência de operações que teriam como destaque o lançamento de 83 foguetes em parceria com a NASA, em 1994, do VS-30 e dos testes com o Veículo Lançador de Satélites (VLS). Em 2010 foi assinado ainda o acordo de cooperação com a Ucrânia para que o CLA também possa servir como base para os foguetes Cyclone-4, capazes de transportar satélites de até 5,3 toneladas para uma órbita baixa. O CLA está preparado para o futuro, com destaque para as operações de lançamento e de rastreio de foguetes. O lançamento de foguetes de treinamento, desenvolvidos pelo Comando da Aeronáutica em parceria com a Agência Espacial Brasileira e a indústria nacional, fecha-se o ciclo de capacitação dos profissionais, garantindo o sucesso das operações no horizonte da área espacial.

Guerra das Malvinas: a defesa aérea brasileira é testada

Episódio 1 - Abril de 1982, feriado de Sexta-feira Santa.

Uma tempestade desaba sobre o Planalto Central. Na Base Aérea de Anápolis (BAAN), o 1° Grupo de Defesa Aérea mantém caças F-103 Mirage e tripulações em alerta, prontas para decolar. Passava das 8 horas da noite, quando o Comando de Defesa Aérea acionou a unidade. De acordo com as primeiras informações, uma aeronave sobrevoava o território brasileiro e a tripulação se negava a prestar qualquer esclarecimento. A noite era tomada por uma grossa camada de nuvens, com raios e trovões. Apesar do tempo adverso, dois pilotos da Força Aérea decolam. Com o uso dos pós-combustores, os dois Mirage sobem rapidamente e, em poucos minutos, o Jaguar Negro Um aproximava-se do alvo a 1,15 vezes a velocidade do som. As nuvens manchavam a imagem do radar, mas os caçadores localizam e identificam o alvo: Ilyushin 62 da empresa estatal Cubana. De fabricação soviética, a aeronave de transporte podia atingir até 900 km/h e 13 mil metros de altitude. Seguindo as orientações do controle em terra, os Mirage se posicionaram ao lado da cabine do avião de transporte, e, quando os pilotos cubanos se negaram mais uma vez a atenderem os chamados do CINDACTA I, o Major José Orlando Bellon afirmou em inglês pelo rádio: “Você foi interceptado. Há duas aeronaves de combate ao seu lado. A ordem é pousar em Brasília imediatamente”. A tripulação cubana avistou os caças brasileiros e, em seguida, fizeram contato solicitando informações para o pouso. O Ilyushin 62 tentava cruzar todo o território brasileiro para seguir diretamente para a Argentina. Entre os passageiros, um diplomata cubano. A aeronave foi liberada apenas no dia seguinte.

Episódio 2 - Junho de 1982.

Pouco antes das 11 horas, o Capitão Raul Dias se preparava para mais uma missão de treinamento com o seu F-5 do Esquadrão “Pif-Paf”, no Primeiro Grupo de Aviação de Caça (1º GAVCA). Pouco antes da decolagem, viu um mecânico correr para o caça e preparar os canhões de 20 mm. Sem entender a situação, ligou o rádio e ouviu o código “Rojão de Fogo” - indicação de que aquela havia se tornado uma missão real de interceptação. Com o Capitão Marco Aurélio Coelho na ala, o Capitão Dias acionou o pós-combustor e rasgou o céu do Rio Janeiro em busca do alvo detectado pelos radares do Primeiro Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA I). Aparentemente em emergência, uma aeronave vinha em direção à capital fluminense e se anunciava como um quadrimotor. “Tivemos um tempo de reação muito rápido, naquelas condições de acionamento. Os minutos que consumimos para decolar, após o primeiro entoar da sirene, não cabem em todos os dedos das mãos”, contou em entrevista recente o Major-Brigadeiro R1 Raul Dias. Com a localização do alvo, a verdade: um bombardeiro britânico Avro Vulcan.Com mais de 30 metros de uma ponta à outra da asa em delta, o quadrimotor participava da missão Blackbuck Six, uma das voadas pela Royal Air Force (RAF) entre a ilha de Ascenção e as Malvinas. Para atacar alvos no arquipélago disputado com a Argentina, as aeronaves da RAF tinham de voar 15 mil quilômetros em até 16 horas. Na Blackbuck Six, a sonda de reabastecimento em voo do Vulcan com matrícula XM 597 quebrou durante um dos procedimentos com um jato Page Victor. Sem combustível para prosseguir, a aeronave foi obrigada a seguir para o Rio de Janeiro, único local onde teria chances de pousar. Para complicar, um míssil AGM-45 Shrike falhou durante o ataque e continuava preso à asa do Vulcan. Criada para detectar emissões de radar, a arma poderia ser acionada quando detectasse o sistema brasileiro de defesa aérea. Foi nesta situação, sem combustível, com problemas no armamento, que o piloto inglês seguiu para o Rio de Janeiro, sem responder aos contatos da defesa aérea. As manobras dos F-5 haviam deixado os brasileiros exatamente atrás e à esquerda do Vulcan. No diálogo, a tripulação do Vulcan deixou claro que não seria possível seguir para a Base Aérea de Santa Cruz (BASC), e que o pouso no Galeão era a única chance. Os F-5 passaram então a acompanhar o alvo e somente deixaram a área após o bombardeiro tocar o solo.


As mulheres ingressam na FABEm 1982 o então Ministério da Aeronáutica deu um passo inédito na sua história: pela primeira vez, mulheres poderiam passar por um treinamento militar e integrar o efetivo da Força Aérea Brasileira. As 150 oficiais e 152 graduadas formadas naquele ano iniciariam uma história de sucesso que se resume nas mais de sete mil mulheres que hoje vestem a farda como médicas, controladoras de voo e até pilotos de caça, dentre outras importantes funções. Para as pioneiras, no entanto, tudo era novidade. “Exatamente o que ia acontecer, eu não sabia. Eu gostava de ver filmes com mulheres militares, mas não conhecia a realidade”, conta Cristina Fernandes da Silva, hoje tenente-coronel. Além dos desafios de aulas como tiro e ordem unida, ela ressalta que na época os uniformes militares eram muito diferentes da moda. “Usávamos boinas e calça durante as instruções”. Mas somente fazer parte das primeiras turmas de mulheres da FAB já era vencer um desafio. Para preencher 150 vagas para oficiais e 150 para graduadas, os concursos receberam quase oito mil inscrições. Os cursos de formação aconteceram no Rio de Janeiro (RJ) e, depois, em Belo Horizonte (MG). Em quatro meses, o treinamento incluiu aulas, marchas, instruções de tiro, educação física e exercício de campanha. Após formadas, elas conquistaram espaço na instituição. Eram funções novas para a Força Aérea, como psicologia, biblioteconomia e análise de sistemas. “No HFAG (Hospital de Força Aérea do Galeão), além de atendimentos, fizemos palestras sobre as especialidades. Assim, públicos interno e externo tiveram um conhecimento maior sobre a nossa profissão. Ganhamos o nosso espaço”, explicou.

Texto: Carla Dieppe – Tenente jornalista da FAB

Fontes consultadas:
- “Blackbuck 6”. Revista Força Aérea N° 49 (jan 2008)
- “Interceptado!”. Revista Força Aérea N° 18 (abr 2000)
- ”Um Vulcan inglês apanhado na rede do Cindacta”, Veja (jun 1982.)

Fonte: Revista Aerovisão–edição especial–janeiro de 2011