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sábado, 16 de abril de 2011

Pioneiros

GASTÃO GALHARDO MADEIRA


Texto de Henrique Lindemberg Filho em Terceiro Centenário de Ubatuba - Edições do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo 1938

Gastão Madeira nasceu em Ubatuba-SP, aos 20 de junho de 1869, sendo filho do dr. Joaquim José Lazaro Madeira e de d. Maria Angélica de Galhardo Madeira. Aos dois anos de idade, passou a residir, com sua família, na vizinha São Luiz do Paraitinga, de onde se mudou, sucessivamente, para Guaratinguetá e Caçapava, e, finalmente, para São Paulo. Tinha o dr. Gastão Madeira, por este tempo, apenas doze anos de idade e já era conhecida a sua vocação para as pesquisas científicas, sendo de notar-se que nessa época a "Província de São Paulo", hoje o prestigioso "Estado de São Paulo", já se referia às mesmas. Aos quatorze anos dedicou-se a sérias observações sobre o voo dos pássaros, com o objetivo de neles descobrir, quando planados, se o centro de gravidade era ou não deslocado, de molde ao fator peso vir a constituir fator propulsão. Baseado nessas observações e auxiliado por acurados estudos de física, ideou uma hipótese que explicasse inteligente e cientificamente a suspensão do corpo, bem como o deslocamento das aves no espaço. Consistia este princípio na fuga da vertical, pelo afastamento do centro de gravidade, hipótese simples na aparência, mas que encerra nada menos que as noções fundamentais do voo. Uma vez estabelecido, por conclusões que não admitiam dúvidas, esse princípio tinha que ser demonstrado materialmente. Iniciou-se, então, para o dr. Gastão Madeira, um penoso período de experiências pacientes que confirmaram, in totum, as suas esplêndidas qualidades de inventor e de homem pertinaz. Nada havia, no ambiente atrasado de São Paulo da época já remota, que pudesse facilitar-lhe o trabalho, a não serem as lições que os seus próprios erros forneciam. Em cerca de duas mil tentativas, não obteve um único resultado que satisfizesse. Entretanto, o seu espírito enérgico resistia a todas as decepções e sua pertinácia vencia os mais sutis imprevistos. Insistiu, por isso, em fazer mais experiências. Abandona no espaço o aparelho que reunia os aperfeiçoamentos aconselhados por uma série enorme de verificações; o pequeno avião desliza suavemente, atingindo o solo em ponto extremamente distante do que em que fora lançado... O próprio inventor fica surpreso ante o êxito obtido! E desde esse instante lhe foi possível afirmar, sustentar sem qualquer receio, que tinha arrancado à Natureza o seu grande segredo. Agora, competia-lhe o direito de exigir da coletividade o reconhecimento e respeito ao seu esforço. Em 1890, requer e obtém a indispensável patente de invenção. Ao mesmo tempo realiza uma conferência no Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, acompanhando suas explicações com experiências feitas a vista de todos, em pequenos aparelhos voadores. O êxito é completo e a importante descoberta nacional é recebida com franco entusiasmo pelos maiorais de nossa engenharia, entre eles Paulo de Frontin, Carlos Sampaio e Álvaro Rodovalho Marcondes dos Reis, que estudam detida e demoradamente o princípio tirando conclusões altamente favoráveis. Entretanto, o mal que persegue todos os gênios estava a rondar os passos de Gastão Madeira: - a escassez de recursos. A falta de meios impediu o inventor patrício de explorar a sua preciosa descoberta. Ante a impossibilidade de tirar proveitos materiais de seu trabalho, satisfez-se com os sinceros aplausos de conterrâneos ilustres como os já enumerados. Publicando, no "Correio Paulistano", em 1892, um estudo completo e fartamente ilustrado de seus trabalhos, o dr. Gastão Madeira terminou as suas investigações acerca do princípio do voo dos pássaros. Volta-se, imediatamente, para o planador, para o dirigível e até para o aeroplano e sustenta que vencerá o mais pesado... Os tempos passam e os recursos materiais não vêm; a engenharia aeronáutica progride e, um dia, eis que o grande Santos Dumont consagra, em prova memorável, o princípio muito anteriormente demonstrado por Gastão Madeira. Qual não terá sido a satisfação deste ubatubense eminente ao ver a sua lei física exposta ao mundo inteiro por seu próprio patrício?! Com o correr do tempo o avião se aperfeiçoa. Entretanto, na verdade obtida em 1890, por Gastão Madeira, ainda permanece o fundamento único da aeronáutica. E vemos, hoje, constituindo a "última novidade" em matéria de aviação, notadamente na cultíssima Alemanha, justamente o aparelho com que Gastão Madeira iniciara os seus esforços: - o simples planador... Basta um confronto entre a farta documentação dos jornais citados, com os desenhos esclarecedores, e o que vemos hoje no espaço! Obtidas as noções básicas da aeronáutica, tornou-se necessária a ampliação do campo científico neste assunto. Gastão Madeira, dedicou-se, então, a pesquisas sobre a estabilidade dinâmica dos aeroplanos. Para tanto construiu pequenos aparelhos, apresentando-os aos professores da Escola Politécnica de São Paulo. As conclusões dos mestres, plenamente satisfatórias, foram reunidas ao então presidente do Estado, dr. Altino Arantes. Esses estudos tiveram forte repercussão no Congresso Estadual, tendo os senadores Almeida Nogueira e Cândido Rodrigues exaltado os trabalhos de Gastão Madeira. Como corolário foi, pelo Legislativo, aprovado um pequeno auxílio para que o inventor continuasse suas invenções na Europa. Em 1914 embarca ele para a França. Não obstante as perturbações acarretadas pela Grande Guerra e o acúmulo de nada menos de 37.000 invenções em estudos nos departamentos técnicos, Gastão Madeira viu suas teorias aprovadas e mereceu considerações altamente elogiosas, feitas pelo próprio ministro Painlevé, que, tendo tido conhecimento do alto valor de seu invento, recebeu, excepcionalmente, em seu gabinete, o inventor ubatubense, para, com ele e assistido por eminentes técnicos franceses, ter de tudo pleno e esclarecido conhecimento. Por intermédio do embaixador brasileiro em Paris, o eminente dr. Olinto de Magalhães, o governo de São Paulo teve ciência da alta distinção de que fora alvo o nosso homenageado. O deputado Freitas Vale propõe, então, que seja fornecida, pelo governo, uma ajuda de custo ao inventor paulista, no que não é atendido, por motivo de ordem econômica advinda da guerra que assolava o mundo. Em 1917, impossibilitado de permanecer por mais tempo na Europa, vê-se na contingência de regressar ao Brasil. Não podendo, por absoluta falta de recursos, pagar as anuidades dos privilégios que obteve na França, na Inglaterra, na Alemanha e nos Estados Unidos, passa pelo tremendo golpe de ver suas patentes caducas, caindo, assim, no domínio de aventureiros que delas vão tirar o máximo proveito. Mas, nem por isso Gastão Madeira deixa de ser reconhecido aos que verdadeiramente conhecem a história da aviação mundial, sabendo-o um dos seus pioneiros. E é assim que, em 1927, tem a consolação de ver o seu nome figurar, ao lado de Bartolomeu de Gusmão, Santos Dumont e outros brasileiros insignes pelos feitos na aviação, na placa de ouro comemorativa da travessia do Atlântico pelo "Jaú". Uma década depois, o "Correio Paulistano" publicou um artigo do saudoso engenheiro Gaspar Ricardo, em que os esforços de Gastão Madeira são apreciados em termos altamente significativos.

Atualização: Em 1937, ao ser celebrado o III Centenário de Ubatuba, a convite do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, Gastão Madeira voltou, pela primeira vez, à sua cidade natal. Durante as festividades, foi inaugurado o obelisco da Praça da Matriz. Menos de dois anos de sua morte, Gastão Madeira ainda registrou um novo tipo de hélices para aeroplanos, hidroplanos, dirigíveis e semelhantes. Ele veio a falecer no dia 04 de abril de 1942.

Fonte: www.ubaweb.com/ubatuba/personagens