Do blog Cultura Aeronáutica, de Jonas Liasch, selecionamos o conteúdo de hoje.
Boa leitura.
Bom domingo!
Um dos maiores problemas encontrados pelos aviadores pioneiros era o motor. Obviamente, não existiam motores de avião à venda, e os pioneiros se viam obrigados a adaptar motores automotivos ou náuticos ou, ainda, construir seus próprios motores. Na virada do Século XIX para o Século XX, os motores automotivos já estavam bem desenvolvidos, mas a potência desses motores ou era muito baixa ou os motores eram pesados demais para se adaptar em uma aeronave. Os irmãos Wright optaram por construir seu próprio motor, mas o mesmo gerava meros 12 HP, insuficientes para funções básicas do voo, como a decolagem, por exemplo. Os aeroplanos dos Wright, por muito tempo, dependeram de auxílio externo (catapultas) para decolar, não sendo considerados verdadeiros aviões, e sim, planadores motorizados. Alberto Santos Dumont, devido às suas experiências com dirígiveis, estava bastante familiarizado com a maioria dos motores disponíveis na época. Quando resolveu abandonar os aerostatos e construir um avião, chegou à conclusão que o melhor motor disponível era o Antoinette V-8, então utilizado em velozes lanchas de corrida. Esse motor foi criado por Léon Levasseur, e batizado de Antoinette em homenagem a uma formosa senhorita, Antoinette Gastambide, filha de seu patrono. Léon imitou assim Gottlieb Daimler, que batizou seus carros e motores de Mercedes em homenagem a outra formosa senhorita, Mercedes Jellineck. O motor Antoinette foi utilizado pela primeira vez em um barco em 1905. Era um motor de 8 cilindros em "V" de 90º, com 24 HP de potência a 1.400 RPM. Esse motor reunia características muito avançadas para a época: o cárter era construído em alumínio fundido, com os cilindros individuais em aço, e a alimentação era do tipo injeção direta de combustível, que era cuidadosamente filtrado, fornecido em alta pressão e dosado precisamente para cada cilindro.
O diâmetro do cilindro e o curso do pistão eram ambos de 80 mm, e o motor original tinha uma cilindrada total de apenas 3,2 litros. A refrigeração era do tipo "evaporação": a água do sistema de refrigeração era pulverizada ao redor dos cilindros, retirando o calor dos mesmos ao se evaporar. Os acessórios, como bomba de injeção, bomba de óleo e magnetos, eram acionados por engrenagens ou correias. O motor original pesava cerca de 50 Kgf e a partida era manual, por meio de uma manivela (foto abaixo).
Santos-Dumont verificou, em suas primeiras experiências, que os 24 HP do motor não eram suficientes para fazer sua aeronave decolar. Trocou o mesmo por outro Antoinette, também de 8 cilindros em V e bastante semelhante ao original, mas com 8 litros de cilindrada e 50 HP de potência a 1.500 RPM. Esse motor de 50 HP foi desenvolvido por Levasseur a partir do Antoinette original de 24 HP, sendo os cilindros substituídos por outros maiores de 110 mm de diâmetro por 105 mm de curso do pistão. Esse motor era mais pesado, 86 Kgf incluindo a água do sistema de refrigeração, mas mesmo assim tinha uma relação peso-potência excepcional para a época, mais de meio Hp por Kgf de peso, que não foi ultrapassada por quase 25 anos. O 14Bis utilizou o motor Antoinette de 50 HP em todos os seus voos, inclusive o voo pioneiro de 23 de outubro de 1906, até ser destruído em um acidente no pouso em Saint-Cyr em 4 de abril de 1907. Santos-Dumont tentou instalar o motor Antoinette de 24 HP, rejeitado no 14Bis, no Demoiselle nº 19, mas a aeronave nunca conseguiu voar nessa configuração. Entretanto, é mais provável que a hélice, construída em uma armação de alumínio entelada com seda, tenha sido a responsável pelo péssimo desempenho da aeronave. A aerodinâmica das hélices, nessa época, era incipiente, e era provavelmente mais responsável pela ineficiência dos grupos motopropulsores do que os motores. A hélice do 14Bis, por exemplo, assemelhava-se mais a remos de caiaque, e desperdiçava muita potência do motor. Levasseur construiu posteriormente um motor V-16 de 100 HP, unindo dois blocos do Antoinette de 8 cilindros. Santos-Dumont utilizou esse motor em uma reconstrução do seu avião nº 15, que tinha se acidentado em seu primeiro teste de voo. Esse nº 15 reconstruído recebeu a denominação de nº 17. O motor Antoinette V-16 recebeu uma hélice tripá de madeira. O avião nº 17, entretanto, foi desativado antes de ser testado, pois Santos-Dumont foi desafiado por seu amigo Charron, em um jantar no restaurante Maxim's, a alcançar a velocidade de 100 Km na água. Santos-Dumont aceitou a aposta, removeu o motor Antoinette V-16 e sua hélice do nº 17 e construiu o Santos-Dumont nº 18, um tipo de aerobarco (foto abaixo). Essa engenhoca, entretanto, tendia a afundar a proa quando o motor era acionado na potência máxima, e Santos-Dumont perdeu a aposta.
Levasseur construiu ainda um gigantesco motor V-32, que nunca chegou a equipar qualquer aeronave. Os motores Antoinette foram os melhores motores aeronáuticos construídos no período pioneiro da aviação, antes da Primeira Guerra Mundial, até o aparecimento dos motores radiais rotativos Rhone.
Fonte: Jonas Liasch em culturaaeronautica.blogspot.com
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