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Voar é um desejo que começa em criança!

domingo, 16 de junho de 2013

Especial de Domingo

Mais um texto do blog Pery de Serra Negra, cuja visita sempre recomendamos a todos. 
Boa leitura. 
Bom domingo!

Decolando com um PT-19
PT-19 -Fairchaild 

A tarde avançava e não havia ali a menor condição de pernoite. Com ajuda do “guarda campo”, do colega que viajava comigo e umas tábuas encontradas no local, desatolamos o avião. O vento fortíssimo de rajadas, bom para pista mais curta,mas que estava encharcada e tinha árvores altas pouco depois do final. Não ia ser fácil arrancar dali àquela tonelada de avião. Demorei na decisão, achava a margem de segurança muito pequena e não havia escolha. Já eram 16 horas, o céu encoberto ia escurecer rapidamente. Pela grande experiência que tinha no PT-19 (Fairchaild), aceitei correr o risco de decolar naquelas condições que se apresentavam. Dei partida no motor acertei o avião no eixo da pista, puxei o freio de estacionamento, ataquei o motor a pleno, contei até cinco e soltei o freio. O avião deu uma arrancada para frente, caindo numa poça d´agua recuperando-se em seguida. Corria e era sustado pelas sucessivas poças de lama que ia encontrando na pista. Ao final do primeiro terço a velocidade ainda não dava para acionar o velocímetro. O motor rugia a toda potência e a temperatura foi lá para as alturas. A pista ia se consumindo e a velocidade pouco aumentava. As árvores preocupavam-me. Sustentava a cauda baixa e caprichava na pilotagem. 
Cockpit - PT -19 

Na metade da pista o velocímetro só marcava 40 MPH; era um verdadeiro pandemônio de água e lama no parabrisa, causado pela hélice a 2.300 RPM, prejudicando a visibilidade. Quando pude divisar algo, vi que as árvores à esquerda, eram as mais baixas. O motor continuava a pleno com a temperatura atingindo alturas perigosas. Não podia reduzir, pois necessitava da potência máxima naquele momento. Também não havia mais tempo e nem espaço para abortar a decolagem. De repente o velocímetro marcou 50 MPH,pronto para o desafio, arranquei o avião do solo com determinação. Ele subiu em meio "stall" e afundou,não se mantendo no ar. Por sorte nossa, voltou ao solo com todo o seu peso, num lugar enxuto e foi ricocheteado para o alto. Com uma ligeira pressão no manche consegui segurá-lo no ar, em voo horizontal, a pouca altura. Cedi o manche para tentar ganhar velocidade. A minha preocupação agora eram as árvores que se aproximavam com uma incrível rapidez; fiz uma ligeira pressão no pedal e fui mudando o rumo para as mais baixas. Pressionei mais um pouco o manche para trás e venci as primeiras árvores que passaram rápidas sob as asas. Já com algum controle no comando de asa, mudei o rumo para esquerda e depois para à direita, desviando as copas mais altas que não consegui ultrapassar. Várias vezes senti o impacto dos galhos no trem de pouso, que não chegou a prejudicar o voo a baixa velocidade. Lentamente fomos ganhando mais velocidade e altura, saindo fora do perigo daquela mata nativa, com árvores de até 30 metros de altura. Iniciei uma subida normal até onde o teto permitiu, rumando diretamente para Salvador. Não gastamos mais do que dois ou três minutos naqueles momentos de grande perigo e tensão. Eu e o avião havíamos sidos submetidos a um verdadeiro massacre na nossa capacidade de resistir, atingindo o ponto de quase rotura. Já na tranquilidade do voo de cruzeiro, o avião bem ajustado nos seus compensadores, o rumo certo, o tempo deu uma chance, e só então soltei os nervos que doíam e os músculos todos tremiam. Esparramado na poltrona de comando aguardava a cidade de Salvador aparecer na proa. 

Texto: Pery Lamartine - "ESCAPE,estórias de aviador"  

Fotos: imagens Google