A busca brasileira pela independência espacial
Construir um veículo lançador de satélites (VLS) nacional é uma ideia nascida em 1985 e, desde então, o Brasil busca sua independência espacial. O desenvolvimento de um foguete de longo alcance permitiria ao País colocar satélites em órbita com seus próprios meios, o que significa não apenas economia, mas também o ingresso em um mercado restrito que movimenta cerca de US$ 170 bilhões por ano. Por isso, o plano brasileiro é promissor: lançar o VLS-1 (V04) em 2015.
Caso a data proposta pelo Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE) seja confirmada, terão se passado 30 anos desde os primeiros passos em direção à independência espacial. Nessa longa jornada, houve três fracassos até o momento. Nas duas primeiras tentativas, em 1997 e 1999, falhas nos componentes levaram à destruição dos foguetes. O terceiro lançamento, em 2003, nem ocorreu. Três dias antes da data programada, o VLS-1 V03 teve uma ignição prematura. A trágica explosão não apenas adiou o sonho da autonomia espacial, como também matou 21 técnicos que trabalhavam na base de Alcântara, no Maranhão.
Autonomia
Em Alcântara, o Brasil já possui um Centro de Lançamento funcional, com posição privilegiada, devido a sua proximidade com a Linha do Equador. O País também domina a construção e montagem de satélites, alguns em parceria com outros países. Mas, a fim de obter avanços e resultados como os dos outros países do Bric (grupo de emergentes que inclui também Rússia, Índia e China), ainda falta desenvolver seus próprios lançadores.
O objetivo não é apenas econômico ou científico. O acesso independente ao espaço facilitaria a obtenção de imagens de grandes territórios do País, auxiliando em proteção ambiental, agronegócios, comércio exterior e defesa. “Países do porte do Brasil não podem prescindir de uma capacidade própria de geração de imagens do seu território, ocupado por cidades que crescem continuamente, florestas a serem protegidas e preservadas ou plantações para o agronegócio”, afirma José Raimundo Coelho, presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB).
Economia
Além disso, com o VLS concluído, o Brasil poderá economizar. Hoje, para lançar um satélite em órbita, é necessária a contratação do serviço de outros países. “A dependência externa representa uma vulnerabilidade indesejável, pois sempre dependeremos da vontade ou decisão de uma nação estrangeira para atingir este objetivo. A capacidade autônoma de lançamento é, portanto, fator de soberania para o Brasil”, argumenta Coelho.
Conforme Alberto Walter da Silva Mello Junior, gerente do projeto VLS-1 e chefe da Coordenadoria de Projetos Espaciais do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), do DCTA – Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial do Comando da Aeronáutica, o País encontra-se, por enquanto, sujeito à disponibilidade, à conveniência e aos custos de fornecedores. O preço de um lançamento depende de vários fatores, incluindo a massa e a órbita que se pretende alcançar. Satélites geoestacionários, que prestam serviços de comunicação no Brasil e podem pesar até sete toneladas, custam entre US$ 15 mil a US$ 30 mil por quilograma. Assim, os valores do lançamento vão de US$ 100 milhões a US$ 220 milhões.
Coelho destaca, no entanto, que alguns serviços são compartilhados com países parceiros na área espacial. Portanto os satélites desenvolvidos em parceria com a China, da série CBERS, têm o custo igualmente dividido entre as duas nações (entre US$ 15 milhões e US$ 20 milhões por lançamento, para cada parte).
O professor da Universidade Federal de Santa Catarina e doutor em astrofísica pela Universidade do Texas, Antonio Kanaan, também defende o acesso independente ao espaço. “Acho que foguetes são como carros. Devemos, sim, ter nossa própria indústria. É a velha questão da dependência tecnológica: a gente vende matéria-prima e depois pega o dinheiro dessa venda para pagar por serviços complexos e caros”, ressalta.
Mercado
Só que esse desenvolvimento custa caro. De 1985 até 2010, estima-se que o Brasil tenha gasto cerca de R$ 2 bilhões com a missão de obter sua independência espacial, somando todos os custos. Mas a recompensa pode ser bem maior. De acordo com relatórios da Associação da Indústria de Satélites, de 2011, o mercado do lançamento de satélites movimenta cerca de US$ 170 bilhões por ano.
Segundo estimativas, quase 1,2 mil satélites devem ser construídos e lançados ao espaço até 2018. Por enquanto, os lançamentos são dominados por EUA, Rússia e França. Bem atrás, estão três países emergentes: China, Japão e Índia, entre os quais o Brasil procura se imiscuir. “De compradores do serviço de lançamento, nos tornaremos fornecedores”, reforça Kanaan.
A importância de um foguete lançador para o futuro do Brasil, no cenário espacial, é inquestionável. Tanto que o País já está há 23 anos desenvolvendo um. Até agora, contudo, diversos contratempos impediram o sucesso da empreitada. “Em desenvolvimento tecnológico, quando se faz algo pela primeira vez, erro é uma das fontes de aprendizado”, afirma o gerente do VLS-1. “Buscamos sempre atingir nossos objetivos da forma mais cautelosa possível. No entanto, não podemos deixar que os percalços nos impeçam de avançar.”
Para que o acidente de 2003 não se repita, diversas medidas foram tomadas. Segundo Coelho, o projeto do VLS e da Torre Móvel de Integração (TMI) foram revistos, com base em uma nova filosofia de testes e certificação e revisão de todos os procedimentos. O centro de controle de lançamentos está sendo modernizado, os produtos estão sendo checados e testados com mais rigor, a torre destruída no acidente foi reconstruída e a nova plataforma, além das inovações, conta com itens de segurança e sistemas elétricos.
Planejamento
Com o objetivo de obter autonomia em lançadores de satélites, a Agência Espacial Brasileira (AEB) e o Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) estão trabalhando em conjunto para lançar o VLS-1 já com uma carga útil real, a ser colocada em órbita ainda em 2015. Embora nenhuma outra tentativa de lançamento com o VLS-1 tenha sido festa desde 2003, os dois centro de lançamento nacionais (de Alcântara/MA, e da Barreira do Inferno, em Natal/RN) foram constantemente exercitados com o lançamento de missões suborbitais e foguetes de treinamento.
Em 2012, a Operação Salina marcou o reinício das atividades relacionadas ao VLS-1. “O objetivo da operação foi realizar o transporte, a preparação e integração mecânica de um ‘mock-up’ estrutural inerte do VLS-1 – estrutura real do veículo sem combustível a bordo – e ensaios e simulações para verificação da integração física, elétrica e lógica da Torre e dos meios de solo do CLA, servindo para validar uma série de aspectos técnicos e de segurança da nova TMI”, explica Coelho.
Missões semelhantes estão programadas antes do lançamento do veículo completo. Conforme o presidente da AEB, a próxima missão será denominada MIR, e fará a verificação elétrica completa do veículo. De acordo o PNAE, está programado para o final de 2013 e o início de 2014 o voo tecnológico do VSISNAV, que está em fase de montagem e vai ser constituído por parte do VLS-1, o primeiro e o segundo estágios ativos. “Servirá para validar o sistema de navegação desenvolvido no Brasil”, explica Coelho.
Orçamento
Se tudo der certo, o lançamento subsequente deve ser um voo de teste com o veículo completo, denominado XVT-02, em 2015, e por fim, a satelitização em 2016, com o protótipo V04. “A partir daí, o VLS-1 estará qualificado como lançador de satélites de pequeno porte. No entanto, os voos do XVT-02 e V04 dependem de complementação de recursos. O orçamento atualmente previsto no Plano Plurianual do governo federal é suficiente apenas para se cumprir os ensaios do MIR e o voo do VSISNAV”, reforça Junior.
Mesmo assim, a AEB e o IAE parecem confiantes nos resultados. “Os sonhos desses homens (que morreram no acidente de 2003) que dedicaram suas vidas ao projeto era o de cumprir a missão de lançar o terceiro protótipo e colocar um satélite em órbita terrestre. Se mantivermos vivos esses sonhos, com certeza daremos ao Brasil a tão almejada autonomia em lançadores de satélites”, garante Junior.
Astronauta Marcos Pontes: Volta ao espaço
Primeiro brasileiro a ir ao espaço, o astronauta Marcos Pontes planeja nova viagem para além da Terra nos próximos anos. Ainda sem uma definição clara sobre a data de sua próxima missão, Pontes disse esperar voltar ao espaço entre 2015 e 2016. Ele viajou para a Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês) no dia 29 de março de 2006, fazendo história ao ficar dez dias em órbita ao redor da Terra.“2015 ou 2016, essa é minha expectativa. Provavelmente, numa missão com os russos, como da outra vez (a Rússia é um dos parceiros majoritários da ISS). Existe a possibilidade sim, e é o que estou esperando”, afirmou.
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