Joseph Kovács 19/3/1926 - 14/07/2019 |
Do Aeromagia selecionamos e voltamos a publicar conteúdo sobre o genial Joseph Kovács, falecido ontem, 14 de julho de 2019, aos 93 anos, em São José dos Campos (SP).
Do fundo do baú de Joseph Kovács
Por Ramiro Silveira
No início da década de 80, a PIPER anunciou um novo modelo do CHEYENNE, com maior capacidade de passageiros e carga somadas a um desempenho fenomenal, equipado com turbo-props GARRET TPE 331 no lugar das usuais PRATT & WHITNEY PT-6. As novas turbinas apresentavam uma capacidade termodinâmica excepcional; a potência máxima no nível do mar era limitada pela caixa de redução, de maneira que, à medida que a altitude aumentava (até um certo limite, cerca de 20000 ft), a potência máxima era mantida. Resultado: o avião era muito veloz, chegava a 350 KTAS no FL250 e passava dos 300 KTAS no FL410!
Nesta época, a EMBRAER já se aventurava no mercado da aviação executiva com o XINGU, e a fim de abocanhar mais uma fatia deste mercado, partiu para o estudo de um avião concorrente, com características inovadoras, que só poderia ser fruto da mente brilhante do Joseph Kovács – muito conhecido por todos por ser o projetista do T-27 Tucano. O novo projeto seria feito a partir de um avião já em produção seriada, mas com maior conforto, maior alcance e mais silencioso.
O próprio XINGU já era feito usando alguns componentes do BANDEIRANTE, do qual herdara a asa com aquele pernicioso (do ponto de vista de arrasto) perfil NACA de 4 dígitos, corroborando a teoria de que um desenvolvimento parcial poderia ser economicamente viável.
O novo avião, bem mais “parrudo” (mais pesado e mais volumoso) que o concorrente, com as mesmas turbinas, não alcançaria os objetivos, mesmo que usando melhor concepção aerodinâmica (como asas supercríticas) ou modernas técnicas construtivas (como materiais compostos), pois seria necessária uma redução drástica (cerca de 10 %) no arrasto global.
Para conseguir desempenho máximo, a ideia era instalar os motores invertidos, posição não adequada para a TPE 331. Assim sendo, optou-se por usar a PT-6, associada a uma pequena turbina (LYCOMING ALF-101) no cone de cauda, que em voo geraria tração extra e ainda poderia ser usada no solo como um APU. Para voos de longo alcance, a ‘turbininha’ seria desligada e as entradas de ar, escamoteáveis, seriam fechadas, para não penalizar com arrasto parasita.
Tendo em vista o patamar em que se encontrava a tecnologia nacional, com o intuito de minimizar riscos, decidiu-se por não usar perfis desenvolvidos dedicadamente para este avião na própria empresa, e então foram escolhidos GAW-2 na raiz e NACA série 6 numa estação intermediária e na ponta, reduzindo de 15 para 9 % de espessura relativa, e com aplicação parcial da modificação B, visando redução da sensibilidade à rugosidade e do Cm.
A meta era desafiadora, muitos e muitos cálculos foram feitos, inclusive com o uso de computadores – um avanço para aquela época – até que se conseguiu otimização da carga alar para cruzeiro sem afetar decolagem e subida.
Nesta época, a EMBRAER já se aventurava no mercado da aviação executiva com o XINGU, e a fim de abocanhar mais uma fatia deste mercado, partiu para o estudo de um avião concorrente, com características inovadoras, que só poderia ser fruto da mente brilhante do Joseph Kovács – muito conhecido por todos por ser o projetista do T-27 Tucano. O novo projeto seria feito a partir de um avião já em produção seriada, mas com maior conforto, maior alcance e mais silencioso.
O próprio XINGU já era feito usando alguns componentes do BANDEIRANTE, do qual herdara a asa com aquele pernicioso (do ponto de vista de arrasto) perfil NACA de 4 dígitos, corroborando a teoria de que um desenvolvimento parcial poderia ser economicamente viável.
O novo avião, bem mais “parrudo” (mais pesado e mais volumoso) que o concorrente, com as mesmas turbinas, não alcançaria os objetivos, mesmo que usando melhor concepção aerodinâmica (como asas supercríticas) ou modernas técnicas construtivas (como materiais compostos), pois seria necessária uma redução drástica (cerca de 10 %) no arrasto global.
Para conseguir desempenho máximo, a ideia era instalar os motores invertidos, posição não adequada para a TPE 331. Assim sendo, optou-se por usar a PT-6, associada a uma pequena turbina (LYCOMING ALF-101) no cone de cauda, que em voo geraria tração extra e ainda poderia ser usada no solo como um APU. Para voos de longo alcance, a ‘turbininha’ seria desligada e as entradas de ar, escamoteáveis, seriam fechadas, para não penalizar com arrasto parasita.
Tendo em vista o patamar em que se encontrava a tecnologia nacional, com o intuito de minimizar riscos, decidiu-se por não usar perfis desenvolvidos dedicadamente para este avião na própria empresa, e então foram escolhidos GAW-2 na raiz e NACA série 6 numa estação intermediária e na ponta, reduzindo de 15 para 9 % de espessura relativa, e com aplicação parcial da modificação B, visando redução da sensibilidade à rugosidade e do Cm.
A meta era desafiadora, muitos e muitos cálculos foram feitos, inclusive com o uso de computadores – um avanço para aquela época – até que se conseguiu otimização da carga alar para cruzeiro sem afetar decolagem e subida.
Kovács considerou que os resultados do estudo preliminar demonstravam a validade da configuração escolhida. Mas, mesmo assim, como sonhar não era proibido, foi proposto um POC, de construção rápida e com baixo custo, equipado com asas de TUCANO, porém tendo a parte central alargada e ponta aumentada (tipo Horner), visando aumento do alongamento e da sustentação e redução do arrasto.
Com essa situação, Joseph Kovács escreveu um documento magnífico, a começar pelo título, que ele chamou de “Filosofia de Projeto”.
Digo isso pelo fato dele ter usado de uma forma, pelo menos para mim bastante inusitada, a palavra grega ‘filosofia’, composta pela união das palavras Philos e Sophia, que, através de uma tradução literal, é simplesmente “amizade à sabedoria”.
Por outro lado, a palavra “filosofia” tem um sentido muito mais amplo, como definem os dicionários da língua portuguesa. São definições tão contundentes como estudo geral sobre a “natureza” de todas as coisas e suas relações entre si – que para alguns poderia soar até como prepotência.
É no mínimo interessante vê-lo fazer uso de uma palavra tão fortemente ligada ao ser humano e sua existência, que discute questões tão essenciais como de onde viemos, quem somos e para onde vamos, para descrever sua metodologia de projeto de maravilhosas máquinas voadoras.
É o que tenho a dizer a respeito dessa “filosofia de projeto” de uma aeronave futurista demais para sua época.
Digo isso pelo fato dele ter usado de uma forma, pelo menos para mim bastante inusitada, a palavra grega ‘filosofia’, composta pela união das palavras Philos e Sophia, que, através de uma tradução literal, é simplesmente “amizade à sabedoria”.
Por outro lado, a palavra “filosofia” tem um sentido muito mais amplo, como definem os dicionários da língua portuguesa. São definições tão contundentes como estudo geral sobre a “natureza” de todas as coisas e suas relações entre si – que para alguns poderia soar até como prepotência.
É no mínimo interessante vê-lo fazer uso de uma palavra tão fortemente ligada ao ser humano e sua existência, que discute questões tão essenciais como de onde viemos, quem somos e para onde vamos, para descrever sua metodologia de projeto de maravilhosas máquinas voadoras.
É o que tenho a dizer a respeito dessa “filosofia de projeto” de uma aeronave futurista demais para sua época.
Texto: Ramiro Silveira - engenheiro de ensaios em voo na EMBRAER
Fonte: Aeromagia