Selecionamos textos publicados na edição especial da Revista Aerovisão, em janeiro de 2011, retratando a admirável trajetória da aviação no Brasil após a criação do Ministério da Aeronáutica.
Boa leitura.
Bom domingo!
Aeronáutica: Anos 2000
A década do futuro e da solidariedade brasileira
Nos anos 2000, a Força Aérea Brasileira realizou as maiores operações de busca e de ajuda humanitária de sua história; a instituição prepara “salto” tecnológico.
A aeronave decola sem piloto, foguetes são lançados com regularidade, aviões estratégicos são produzidos e desenvolvidos pelo Brasil, mísseis de última geração estão em pesquisa e já se testa a possibilidade do avião hipersônico, aquele que voa seis vezes a velocidade do som, dentre outras novidades. Quem poderia imaginar, lá no início desta história, em 1941, que a Aeronáutica brasileira iria voar tão alto? Alguns cenários que edificam essa primeira década pareceriam, há alguns anos, filmes de ficção científica. Mas são em sua totalidade, sobretudo, emocionantes roteiros de ação. Uma nova família de foguetes - “Cruzeiro do Sul” -, movidos à combustível líquido está nascendo no Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA).
O Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, passou por profundas transformações para a retomada do projeto do Veículo Lançador de Satélites (VLS).
A Força Aérea Brasileira estuda e faz sair do papel com testes em túneis de vento uma aeronave hipersônica, projeto para que o equipamento voe com uma velocidade seis vezes maior que a do som. O nome da aeronave é 14X, numa referência imediata ao primeiro mais pesado que o ar que efetivamente decolou em 1906 pela genialidade e persistência de Alberto Santos Dumont.
Em 2007, o Instituto de Estudos Avançados (IEAv) deu início aos testes com um modelo experimental reduzido do 14X, com 80 cm de comprimento, construído em aço inoxidável, que é equipado com sensores de pressão, fluxo de calor e força. De fato, a primeira década deste século tem sido próspera em cenas que fascinam os apaixonados pelas coisas do espaço.
Outro estudo importante envolve o desenvolvimento do primeiro Veículo Aéreo Não-Tripulado (VANT) brasileiro, capaz de apoiar missões militares e civis, principalmente na área de segurança pública e de defesa civil. O projeto reúne as Forças Armadas e a indústria nacional e tem como objetivo domínio de tecnologias sensíveis utilizadas e que representariam para o país, na prática, um ganho imensurável.
Horizonte
O processo de reaparelhamento caminha com a aquisição de novos caças para a defesa do país (Projeto F-X2), de aeronaves A-29 Super Tucano, de aviões de patrulha (P-3AM), de transporte (C-99, C-105 Amazonas), de helicópteros (AH-2 Sabre, H-60 BlackHawk e H-36), além da modernização dos F-5 E e dos A-1. Uma importante parceria está em curso com a indústria brasileira (EMBRAER) para o desenvolvimento de uma aeronave de transporte de grande porte, o KC 390, projeto que já reúne diversos países como parceiros.
O Brasil integra o seleto grupo de nações que está à frente do sistema que irá revolucionar o controle de tráfego aéreo no mundo, com a criação do espaço aéreo contínuo (CNS-ATM) gerenciado com o apoio de satélites. Esse sistema, em inglês, reunirá Comunicação (C), Navegação (N), Vigilância (S) e Gerenciamento de Tráfego Aéreo (ATM). Em auditoria da Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), o serviço prestado pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (DECEA) foi avaliado como um dos cinco melhores do mundo.
Os anos 2000, de fato, sinalizam a alta tecnologia como essencial para o futuro. Nesse filme tão real, tão brasileiro, são as iniciativas das pessoas as grandes heroínas. O protagonista chama-se profissionalismo. A defesa do país exige cada vez mais tecnologia, como demonstrado pelas aeronaves R-99 durante as buscas dos destroços do voo AF-447: com sensores de última geração, a Força Aérea pôde prosseguir com as buscas, no meio do Atlântico, até mesmo durante a noite, auxiliando na operação de resgate. O avião em questão é brasileiro, criado em parceria com a indústria nacional.
Espaço
Nesse cenário futurista, tanto o Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, como o Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI) são tidos como referencias no mundo não só para propiciar o voo de foguetes, mas também para rastrear equipamentos do mundo inteiro que passam pelo espaço brasileiro. As organizações atuam em cooperação para o desenvolvimento da pesquisa aeroespacial. Rastrear, por exemplo, significa acompanhar com equipamentos extremamente modernos para que os voos aconteçam dentro do previsto.
Os lançamentos de foguetes brasileiros VSB-30 foram realizados em 2004 com o objetivo de realizar experimentos diversos em ambientes com menos força da gravidade. Chega a seis vezes a velocidade do som. A cada lançamento, militares e cientistas brasileiros são beneficiados com os conhecimentos adquiridos.
Futuro
Nos últimos anos, a instituição também concluiu seu Plano Estratégico Militar da Aeronáutica (PEMAER), de forma a traçar, metodicamente, como será a Força Aérea Brasileira até 2031 e o que a instituição terá de fazer pelos próximos 20 anos para chegar a esse objetivo.
“A FAB será reconhecida, nacional e internacionalmente, pela sua prontidão e capacidade operacional para defender os interesses brasileiros em qualquer cenário de emprego, em estreita cooperação com as demais forças”, afirma o documento.
O ano de 2006 foi histórico. O então Tenente-Coronel-Aviador Marcos Cesar Pontes tornou-se o primeiro astronauta brasileiro a chegar ao espaço. A Missão Centenário, que recebeu o nome em homenagem aos 100 anos do voo do primeiro avião, o 14-Bis de Alberto Santos Dumont, começou em 29 de março daquele ano, no Cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão. A bordo da Soyuz russa, o militar brasileiro, o russo Pavel Vinogradov e o americano Jeffrey Williams, foram enviados para a Estação Espacial Internacional (ISS). Na bagagem do primeiro astronauta do Brasil, seguiram para o espaço experimentos selecionados pela Agência Espacial Brasileira. Quando voltou ao Brasil, foi recebido como herói. “Foi na FAB que aprendi a voar e a querer cooperar com esse tipo de trabalho. Ser astronauta foi uma consequência da minha trajetória”, disse.
Exercício Cruzeiro do Sul (CRUZEX) ajudou a revolucionar o emprego da FAB
“Em menos de dez anos a Força Aérea Brasileira modificou totalmente a sua forma de empregar o poder aeroespacial. Até então, operávamos de forma semelhante ao que foi empregado no Vietnã e em outros conflitos das décadas de 70 e 80”, afirma o Tenente-Brigadeiro-do-Ar Gilberto Antonio Saboya Burnier, hoje à frente do Comando-geral de Operações Aéreas (COMGAR), ao falar da importância dos conhecimentos adquiridos com a realização das cinco edições do Exercício Cruzeiro do Sul (CRUZEX). A primeira edição do treinamento aconteceu em 2002.
Pouso autorizado. Chega o avião, que taxia até o hangar. Quem pilota tira as luvas, desembarca e retira o capacete. Cabelo preso e alegria por mais uma missão cumprida. Cenas como essa tornaram-se comuns desde que as primeiras cadetes aviadoras começaram a voar. A Força Aérea Brasileira já conta com 18 tenentes e 29 cadetes. As primeiras ingressaram na Academia da Força Aérea em 2003, fato inédito para a aviação militar do país. Eram 20 oportunidades, que foram preenchidas depois de concurso com uma relação candidato-vaga em torno de 150 candidatos para cada vaga. Na caminhada, passaram pelo salto de emergência com paraquedas, pelo exercício de campanha e pela instrução teórica e prática do voo, além da instrução acadêmica oferecida pela Academia da Força Aérea, em Pirassununga (SP).Da primeira turma, onze concluíram o curso. As aviadoras já chegaram à aviação de caça, de transporte, de reconhecimento e de asas rotativas.
Tempos da solidariedade e de grande mobilização
Nos anos 2000, a Força Aérea realizouas maiores operações de resgate e de ajuda humanitária de sua história; Missões aconteceram no Brasil, no Líbano, no Haiti, no Chile e em diversos países para os quais a nação enviou socorro e apoio. Para quem viveu, houve dias em que não parecia restar nada. Para quem viveu em perda, é como se a luz tivesse desaparecido. Solidariedade foi a luz que conduziu homens e mulheres para minimizar dores. Nessa época, ocorreram operações militares que entraram para a história e que permanecerão intocadas ainda que com o avançar do tempo. Quando a terra treme, um avião desaparece, uma cidade é alagada ou uma floresta se desfaz, só se pode contar com a ajuda dos outros. Foi assim que homens, mulheres e aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB) quebraram recordes de mobilização e de dedicação, no Brasil e no exterior. Em 2009, uma aeronave da Air France, no voo AF 447, desapareceu no meio do Oceano Atlântico. A bordo do voo AF-447, 228 pessoas e nenhum sobrevivente encontrado. Na missão, mais de 1.500 horas de voo e a atuação direta de mais de mil profissionais da Aeronáutica e da Marinha. Ficou conhecida como a maior operação de busca e resgate da história do país, tendo em vista as imensas dificuldades de atuar numa área que seria praticamente a metade de distância até a África. A aeronave desapareceu no dia 31 de maio de 2009. Depois que os corpos foram encontrados, foi realizada também uma complexa operação de transporte, do mar para o navio, do navio até Fernando de Noronha, e do Arquipélago até o continente. Em 2006, quando eclodiu a guerra entre Líbano e Israel, aeronaves militares e civis, mobilizadas pelo Ministério da Defesa, estabeleceram uma verdadeira ponte-aérea entre o Brasil e a Turquia, destino final dos comboios terrestres organizados pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Mais de 1.800 brasileiros foram resgatados. No segundo dia do cessar-fogo, uma C-130 Hércules pousou em Beirute carregado com ajuda humanitária.
Enchentes
No Brasil, cheias em diversas regiões mobilizaram a FAB para o transporte de alimentos e remédios, resgate de vítimas e socorro aos doentes. A operação mais difícil foi em cidades de Santa Catarina, em 2008. Foram cumpridas mais de 500 missões com helicópteros e aviões, particularmente na região do Vale do Itajaí, uma das áreas mais afetadas pelas cheias. Além da atuação das unidades aéreas, a equipe do Hospital de Campanha da Aeronáutica atendeu mais de três mil pessoas. Em 2009 e 2010, a FAB voltou a atuar de forma decisiva para diminuir os impactos de enchentes, dessa vez, na Região Nordeste, no Maranhão, Piauí, Alagoas e Pernambuco. Na ocasião, os militares a bordo dos helicópteros voltaram a resgatar pessoas de telhados de casas ou de cima de árvores. O Hospital de Campanha foi instalado na cidade de Barreiros (PE) e superou seis mil atendimentos. Em 2007, a Força Aérea já havia atuado na Bolívia, em uma das maiores enchentes daquele país. Ao longo de mais de dois meses de operação, a FAB e o Exército transportaram mais de cem toneladas de alimentos e medicamentos. Duas mil pessoas foram resgatadas. “Nem o povo, nem o governo da Bolívia, nem eu, Evo Morales, vamos esquecer o que esses brasileiros fizeram por nós”, afirmou o presidente daquele país, em uma das muitas ocasiões em que elogiou publicamente o apoio do Brasil.
Terremotos
Em 2008, a FAB foi encarregada de transportar alimentos e remédios para a cidade de Pisco, no Peru, fato que fez a diferença em um local devastado com mais de 500 mortos. Outras cidades próximas também foram vítimas da catástrofe. Mas nenhum ano na história moderna sofreu tanto com tremores de terra como o de 2010. Particularmente por causa da tragédia no Haiti. Foram mais de 300 mil mortos. A solidariedade mundial se encontrou naquele país. O Brasil chegou lá pelas asas da FAB, que realizou uma ponte aérea de transporte de vários gêneros. O que pode ser contabilizado é que a Força Aérea Brasileira transportou mais de 1.300 toneladas de carga e 2.329 passageiros em apoio à Operação. O Hospital de Campanha (HCAMP) totalizou 9.718 atendimentos clínicos e 218 cirurgias em Porto Príncipe. No mesmo ano, a FAB partiu com dois helicópteros H-60 Black Hawk para o Chile. O país também foi vítima do terremoto e os militares atuaram no transporte de alimentos e no resgate de vítimas. Cada missão dessas trouxe um sem-número de necessidades, aprendizados e situações inesperadas. Ao longo da década, as aeronaves cortaram o mundo levando ajuda a países necessitados, como Zâmbia e Moçambique, na África, entre outros. Cada missão levou os militares a se defrontar com cenários tristes e inimagináveis. Cada missão fez também com que os militares recebessem abraços, sorrisos e agradecimentos. Isso jamais será esquecido.
Fonte: Revista Aerovisão – edição especial – janeiro de 2011
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