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Voar é um desejo que começa em criança!

domingo, 3 de novembro de 2024

Especial de Domingo

Confira mais uma antiga história de um avião Latécoère no Brasil.
Boa leitura.
Bom domingo!

Foto antiga mostra avião Laté 26 puxado por junta de bois
O retrato de um avião sendo rebocado por uma junta de bois. Esta fotografia inusitada traz um aspecto interessante das dificuldades nos primeiros anos da aviação comercial no Brasil. O registro é de uma aeronave do tipo Latécoère 26, da companhia Aéropostale (antes denominada Latécoère e depois Air France) com a matrícula F-AILK. O original da imagem, de acordo com a escritora Maria Angélica de Moura Miranda, faz parte do acervo do Arquivo Histórico da cidade de São Sebastião, litoral do Estado de São Paulo, como doação do fotógrafo Álvaro Doria Orselli.

Aérospatale / Air France
O episódio teria ocorrido, segundo a tradição oral, embora sem referências mais contundentes, em São Sebastião, na Praia da Frente, durante o período de operação da Aéropostale no Brasil, entre novembro de 1927 e 1934, sendo que, desde 1933, a empresa formou, junto com outras companhias, a Air France. Numa análise da foto é possível verificar que não consta na fuselagem as tradicionais marcas “Compagnie Générale Aéropostale”, o que pode significar ser um flagrante após outubro de 1933, quando a empresa passou a se chamar Air France, e antes de 5 de agosto de 1934, data na qual o avião sofreu um acidente e foi desativado definitivamente.

Pouso eventual?
A movimentação com junta de bois poderia ter sido após um pouso eventual, inopinado, por alguma deficiência técnica ou meteorológica, já que a localidade de São Sebastião não fazia parte das escalas da Aéropostale e os mais próximos pontos regulares de pouso e decolagem eram nas cidades Rio de Janeiro e Santos. No segmento Sul, a linha da Aéropostale cobria a rota Rio-Buenos Aires-Rio, com escalas em Santos, Florianópolis, Porto Alegre e Pelotas. Na trajetória Norte da linha, as escalas eram em Vitória, Salvador, Maceió, Recife, Natal e Fernando de Noronha.

O Laté 26
O F-AILK era um monoplano francês do tipo Latécoére 26-2.R, uma versão mais alongada que o 25. Tinha 12,20 m de comprimento; envergadura de 17,4 m; altura 3,7 m; peso 1,6 ton; peso máximo de decolagem 3,3 ton; Motor Renault 12Ja ou 12Jb ou Hispano-Suiza 12Hbxr ou PD Gnome-Rhone14Kb; Velocidade máxima de 190 Km/h; e, Alcance de 680 quilômetros. Do modelo foram fabricadas 90 unidades. O Laté 26 transportava um piloto, um operador de rádio e cinco passageiros, além da carga postal.

A desativação do F-AILK
O F-AILK da Companhia Geral Aéropostale teve o número de fabricação 662 e entrou em operação em 12 de dezembro de 1927, sendo movimentado de Toulouse (França), para ficar baseado no Rio de Janeiro. Em 1933 passou para o patrimônio da Air France, uma nova empresa formada pela Aéropostale e outras companhias. O fim das operações com o F-AILK se deu no dia 5 de agosto de 1934, devido a um acidente. Ele fazia um voo extra de fretamento. Na localidade de Itamaraju, no Estado da Bahia, possivelmente, conforme relatos locais, devido neblina, o aparelho fez uma aterrissagem forçada, no lugar onde existia uma lagoa e, em 2024, é o Mercado Municipal. O curioso é que o avião foi transportado para a cidade de Prado, via fluvial, em duas canoas juntas, pelas águas do rio Jucuruçu, segundo registro do sítio eletrônico desatresaereos.net. O espaço da rede mundial de computadores do “Bureau of Aircraft Accidents Archives” informa que o Laté 26 F-AILK, no dia 05 de agosto de 1934, saiu, às 14h35, horário local, de Santo Amaro (Bahia), num voo de receita não programado (fretamento), com cinco passageiros e dois tripulantes, o piloto Victor Etienne e o rádio-operador Henrique Baudel. No acidente, todos os passageiros ficaram levemente feridos, enquanto o piloto morreu e o operador de rádio ficou gravemente machucado e faleceu, no dia seguinte, devido aos ferimentos.

A companhia aérea
A empresa francesa de correio Aéropostale foi constituída, em 1927, como sucessora da Latécoère, existente desde 1918. Mais tarde, em novembro de 1933, passou à denominação Air France. A linha transportava mala postal desde a Europa, passando pela costa da África, chegando ao Brasil em Fernando de Noronha, seguindo com escalas até Pelotas e prosseguindo a Buenos Aires, na Argentina. No Brasil, havia pontos de escalas equipados com hangar, casa de pilotos, transmissão telegráfica sem fio e aeródromos. Um voo do Rio de Janeiro a Buenos Aires levava de 13 a 15 horas. A companhia empregou pilotos que se tornaram heróis por seus feitos pioneiros. Entre eles estavam os ases Jean Mermoz, Henri Guillaumet, Paul Vachet, Marcel Reine, Leon Antoine, Victor Etienne, entre outros. Um nome, entre todos, tornaria eterna a história daqueles tempos da “linha”: Antoine de Saint-Euxpéry, “poeta da aviação”, cujas obras narram o cotidiano e os feitos dos pilotos da Aéropostale, culminando com o livro mais lido e traduzido do mundo, que ele próprio ilustrou: "O Pequeno Príncipe". Em novembro de 1933, a Aéropostale fundiu-se com outras companhias aéreas (Air Orient, Société Générale de Transport Aérien, Air Union e Compagnie Internationale de Navigation) dando origem à Air France. ​

Um Antoine aterrissou em Ubatuba
Uma lenda perdurou por décadas em Ubatuba (SP), segundo a qual o escritor e piloto francês, autor de “O Pequeno Príncipe”, Antoine Saint -Exupéry teria feito um pouso na cidade, em 1933. O desfecho do mito é esclarecido com a reprodução do trabalho do jornalista Luiz Ernesto Kawall (1927– 2024), num dos capítulos do livro “Sobre o Mar de Iperoig: a aviação em Ubatuba”. A lenda nasceu com a aterrissagem, em Ubatuba, do Latécoère 26, matrícula F-AILR, da Aéropostale, em junho de 1933, pilotado por Leon Antoine que, à época, fora confundido com Antoine de Saint-Exupéry. Essa história foi esclarecida por meio das pesquisas do jornalista Kawall, que localizou o verdadeiro piloto daquela aeronave. Ambos, Leon Antoine e Saint-Exupéry, faziam, à época, voos na mesma rota e eram amigos. Leon Antoine, após se desligar da aviação comercial, passou a viver no Brasil, residindo na região serrana do Rio de Janeiro. No seu retorno a Ubatuba, confirmou a história daquele pouso e de como fora recepcionado pela cidade à época.

Fontes: Golden Years of Aviation (history.org.uk); Bureau of Aircraft Accidents Archives (baaa-acro.com); Aviação Comercial.net (aviacaocomercial.net); Desastres Aéreos / Brasil 1930-1939 (desastresaereos.net); Aéroplanes (jnpassieux.fr); AMAB – Associação Memória da Aéropostale no Brasil (amab-saint-exupery.com); Avião puxado por bois (comunicação oral de Maria Angélica de Moura Miranda); e, “Sobre o Mar de Iperoig: a aviação em Ubatuba” (livro editado pelo Instituto Salerno-Chieus)

Fotos: Bois puxando avião (Arquivo Histórico de São Sebastião, SP); Comparativo marcas Aéropostale e Air France (NINJA – Núcleo Infantojuvenil de Aviação)

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