O Núcleo Infantojuvenil de Aviação - NINJA - volta a publicar conteúdo que sintetiza a trajetória de muito esforço, inteligência e talento que possibilitou a consolidação da indústria aeronáutica brasileira.
Boa leitura.
Bom domingo!
A CRIAÇÃO DO ITA
Ao longo da década de 30 a aviação brasileira apresentou um crescimento expressivo. A aviação militar era impulsionada pela atmosfera de guerra que tomava o mundo e que evidenciava a necessidade da arma da aviação. Por outro lado, a criação do Correio Aéreo Militar, mais tarde Correio Aéreo Nacional, exprimia a preocupação da jovem oficialidade de ocupar as fronteiras reais, conectando o maior número possível de cidades do interior aos polos administrativos e econômicos situados no litoral. Casimiro Montenegro Filho, um dos fundadores do Correio Aéreo Militar, integrava o contingente dos que identificavam na aviação um instrumento privilegiado de integração do país.
Casimiro Montenegro Filho - Marechal do Ar, Engenheiro Militar,
Patrono da Engenharia Aeronáutica Brasileira |
A aviação civil, de seu lado, crescia alimentada pela expansão do transporte aéreo e dos aeroclubes. No entanto, até 1940 nenhum engenheiro aeronáutico havia sido formado no país. Essa carência de recursos humanos começava a ser enfrentada em 1938 com a iniciativa da Escola Técnica do Exército de criar o primeiro curso de especialização em engenharia aeronáutica. Dois anos mais tarde, formava-se a primeira turma da escola, com oito engenheiros, entre eles Casimiro Montenegro.
Com a criação do Ministério da Aeronáutica, fora instituída a Diretoria Técnica, e Montenegro foi seu primeiro titular. Nessa época, ele viajou aos Estados Unidos para buscar aviões comprados pelo Brasil, visitando o centro de pesquisa aeronáutico Wright Field. De volta ao país, ele passou a defender a tese de que o país deveria contar com um centro de pesquisa e de formação de pessoal qualificado que pudesse constituir-se na base sobre a qual se desenvolveria a aviação e a indústria aeronáutica no país. A Escola Técnica do Exército oferecia um curso de especialização, de dois anos de duração.
Somente com a criação do ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica, o país passou a contar com um curso superior pleno de formação de recursos humanos em aeronáutica. Um dos assistentes de Montenegro era o engenheiro Artur Amorim formado no Massachussets Institute of Technology, o famoso MIT. Por essa razão, em nova viagem aos EUA, Montenegro procurou o instituto pensando em obter auxílio para a instalação de um centro de pesquisa aeronáutica no Brasil. Richard Smith, o chefe do departamento de engenharia aeronáutica, estava ausente e Montenegro deixou uma carta e o esboço do centro que imaginava. Pouco depois, ainda nos EUA, em Washington, Montenegro recebeu de Oswaldo Nascimento Leal, outro brasileiro que estudava no MIT, a notícia de que Smith havia lido seu documento e declarava estar disposto a vir ao Brasil ajudá-lo a constituir o centro de pesquisa. Começava a nascer o CTA - Centro Técnico da Aeronáutica que, anos mais tarde, passou a se chamar Centro Técnico Aeroespacial tendo, atualmente, a designação de Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial.
Richard H. Smith
1º Reitor do Inst. Tecnológico de Aeronáutica
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Com a aceitação de Smith, Montenegro elaborou o Plano de Criação do Centro Técnico da Aeronáutica, documento entregue em agosto de 1945 ao então Ministro Salgado Filho pelo Chefe do Estado Maior da Aeronáutica, Armando Trompowsky, um entusiasta da ideia. Em novembro do mesmo ano, com a queda de Getúlio Vargas, Trompowsky tornava-se ministro e em 16 daquele mês o presidente José Linhares aprovava o Plano. Em janeiro de 1946 era criada a Comissão de Criação do CTA, com recursos do Fundo da Aeronáutica. Em março de 1947 tinham início as aulas da primeira turma do ITA, ainda na Escola Técnica do Exército, em instalações do Ministério da Aeronáutica, junto ao Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Estes alunos diplomaram-se no final de 1950, já em São José dos Campos-SP, após a transição iniciada em 21 de maio daquele ano. Nesta época, começavam a chegar professores dos Estados Unidos como Theodorsen e Fayette Taylor, ambos do MIT. Richard Smith tornava-se o primeiro reitor.
Vale citar que Santos-Dumont, em 1918, em seu livro "O que eu vi. O que nós veremos." registrou a ideia da criação de uma escola técnica no Brasil, voltada para a aviação, antevendo um centro de tecnologia que só se efetivaria cerca de 30 anos mais tarde:
"Eu, que tenho algo de sonhador, nunca imaginei o que tive ocasião de observar, quando visitei uma enorme fábrica nos EUA. Vi milhares de hábeis mecânicos ocupados na construção de aeroplanos, produzindo diariamente de 12 a 18. Quando o Congresso Americano acaba de ordenar a construção de 22.000 dessas máquinas, nós, aqui, não encaramos ainda esse problema com a atenção que merece. A principal dificuldade para a navegação aérea está no progresso dos motores... Já o aço tem sido melhorado... É tempo, talvez, de se instalar uma escola de verdade em um campo adequado... Margeando a linha da Central do Brasil, especialmente nas imediações de Mogi das Cruzes, avistam-se campos que me parecem bons. Os alunos precisam dormir junto à Escola, ainda que para isso seja necessário fazer instalações adequadas... Penso que, sob todos os pontos de vista, é preferível trazer professores da Europa e dos EUA, em vez de para lá enviar alunos. Meu mais intenso desejo é ver verdadeiras Escolas de Aviação no Brasil. Ver o aeroplano, hoje poderosa arma de guerra, amanhã meio ótimo de transporte, percorrendo as nossas imensas regiões, povoando nosso céu, para onde, primeiro, levantou os olhos o Pe. Bartolomeu Lourenço de Gusmão"
Confirmando a visão do Pai da Aviação, o ITA inovou no ensino superior brasileiro. Os alunos dispunham de moradia no campus e bolsa oferecida pela escola. O curso era gratuito e os professores trabalhavam em regime de dedicação integral ao ensino e à pesquisa, sistema até então adotado somente pela Universidade de São Paulo. A estrutura da escola era departamental e os cursos, semestrais, conforme o modelo norte-americano. O ambiente cultural do ITA estava mais próximo de uma universidade do que de um centro de pesquisa militar. O inglês era a língua mais utilizadas nos cursos, que envolviam professores de mais de 20 nacionalidades, alguns deles pesquisadores com projeção em suas áreas, como o matemático irlandês Francis Dominic Thurnaghan. Também eram intensas as relações da escola com o mundo acadêmico brasileiro. O primeiro titular do Departamento de Física, Paulus Aulus Pompéia, vinha da USP, onde era colaborador de Gleb Wataghin. Ele se aproximara de oficiais da aeronáutica pela necessidade de valer-se de aviões capazes de voar a uma altitude de sete mil metros, para a realização de experimentos sobre raios cósmicos. O ITA foi pioneiro sobretudo em sua primeira década de existência. Em 1951 instituiu o primeiro curso de engenharia eletrônica. Dez anos depois criou a primeira pós-graduação em engenharia e em 1963 instalou um laboratório de processamento de dados. Em sessenta anos (1950-2010) o ITA formou mais de cinco mil engenheiros.
Vídeo institucional ITA
Esses recursos humanos fizeram-se presentes no desenvolvimento de diversas tecnologias no Brasil. O uso do álcool em motores a combustão foi estudado pioneiramente no CTA pelo professor Urbano Stumpf, da turma de 50. Um grupo de alunos realizou o projeto do computador Zezinho, o primeiro construído no país. Os principais dirigentes da Embraer formaram-se na Escola, como Ozires Silva, da turma de 62. A trajetória do ITA revela o alto retorno dos investimentos realizados pelo país no ensino superior. O ITA trouxe para o Brasil o projetista alemão Henrich Focke, que desejava desenvolver o projeto de um aparelho convertiplano, capaz de decolar na vertical e voar como um avião. A vinda de Focke em 1951 ampliava as atividades de pesquisa no ITA. O projeto envolveu cerca de 20 especialistas e uma equipe de 40 pessoas. Embora sem resultados práticos, o projeto contribuía para a formação de pessoal. Em fins de 1953 foi interrompido e, em 1955, Focke deixou o país, mesmo ano em que foi criado o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IPD) do CTA. Diversos projetos de pesquisa foram realizados no IPD. Hans Swoboda, um auxiliar de Focke que se radicara no Brasil, projetou um helicóptero experimental de dois lugares em 1955, denominado “Beija-Flor”.
Um protótipo foi construído, voando até 1965, quando o aparelho sofreu um acidente. O projeto não teve continuidade.
Também no IPD foi projetado o avião Bandeirante, que deu origem à Embraer.
No dia 26 de outubro de 1968, em cerimônia oficial, no CTA, com a presença do Ministro da Aeronáutica, vários Ministros de Estado, de autoridades civis e militares e cerca de 15 mil pessoas, que afluíram ao Aeroporto de São José dos Campos, foi realizado o voo oficial da aeronave Bandeirante. Uma exclamação geral elevou-se aos ares, ao serem abertas as portas do hangar X-10 para a saída e apresentação oficial da aeronave. O Maj. Mariotto e o Eng. Michel partem da cabeceira da pista para a realização da primeira decolagem e do primeiro voo oficial do Bandeirante, numa inesquecível demonstração ao país da existência de condições, capacidade e competência na consolidação e progresso da indústria aeronáutica brasileira.
Fontes: Vencendo o Azul / Museutec / Youtube
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